Tribunal de Justiça de São Paulo anula contrato de franquia por violação dos deveres de informar e de transparência

0
567

Recentemente, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou recurso de apelação, cujo objeto era a anulação do contrato de franquia celebrado entre franqueadora e franqueado.

A franqueadora deixou de apresentar balanços e demonstrativos financeiros junto com a Circular de Oferta de Franquia, tal como exige o art. 2º, inciso III, da Lei nº 13.966, de 26.12.2019, que disciplina o sistema de franquia empresarial.

Além disso, no plano de negócios apresentado ao franqueado, havia a previsão de rentabilidade que, após o início das atividades pelo franqueado, mostrou-se muito além da real lucratividade.

Em primeira instância, o magistrado julgou procedente a ação de rescisão contratual cumulada com cobrança de multa contratual, que foi ajuizada pela franqueadora contra o franqueado, ao considerar que o franqueado deu causa à rescisão motivada do contrato, ao deixar de pagar os fornecedores, e, por isso, foi condenado no pagamento de multa contratual.

Por outro lado, o magistrado julgou improcedente a reconvenção apresentada pelo franqueado, que visava à anulação do contrato de franquia em razão da violação do dever de informar pela franqueadora, pois entendeu que o fraqueado não havia demonstrado o efetivo prejuízo causado pela não apresentação do balanço e das demonstrações, além da rentabilidade sofrer influência de diversos fatores alheio às partes e, portanto, tratar-se de risco inerente à atividade econômica.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua vez, reformou a sentença, pois entendeu ter havido culpa concorrente das partes.

De acordo com o acórdão, o TJSP entendeu que o franqueado incorreu em culpa ao não ter capital para pagamento de seus fornecedores, causando problemas à franqueadora perante os fornecedores e demais parceiros comerciais comuns entre as partes.

Por outro lado, o TJSP entendeu também que a franqueadora incorreu em culpa ao divulgar, no plano de negócio, uma rentabilidade muito superior à rentabilidade real sem qualquer respaldo em documentos, o que constituiu não mera irregularidade, mas violação dos deveres de informação e de transparência, que são consectários do princípio geral da boa-fé, o que frustrou as justas expectativas do franqueado, mesmo considerando os riscos inerentes à atividade econômica e as diversas circunstâncias que podem afetar a lucratividade da empresa.

Em relação à não apresentação dos balanços e demonstrações financeiras, o Tribunal entendeu que tais irregularidades não foram acompanhadas de provas de efetivo prejuízo ao franqueado, conforme entendimento sumarizado no Enunciado IV do Grupo de Câmaras Reservadas de Direito Empresarial, que exige prova do efetivo prejuízo em casos de irregularidades.

Diante da culpa concorrente das partes, o Tribunal de Justiça decidiu por rescindir o contrato e, ao mesmo tempo, estabelecer um equilíbrio econômico quanto às verbas pagas, a serem pagas e a serem restituídas.

Leia também: Terceira turma do STJ afasta alegação de fraude contra credores sobre doação de imóvel que não perde a finalidade de moradia da família

Dessa forma, o julgado mencionado sintetiza a extrema relevância da Circular de Oferta de Franquia conter informações reais, pautadas em documentos e experiências anteriores com outros franqueados, não podendo conter informações inverídicas e não respaldadas por documentos, visto que o contrato de franquia é considerado um contrato de adesão, que exige efetiva informação ao pretendente a franqueado e transparência real de tais informações, justamente para dar ao futuro franqueado a exata noção do negócio do qual pretende participar. Os deveres de informar e de transparência decorrem diretamente do princípio geral da boa-fé e mostram-se muito relevantes na fase pré-contratual das negociações de um contrato de franquia empresarial, visto que a atividade econômica sofre diversos influxos alheios à vontade das partes contratantes que podem culminar com o sucesso ou insucesso da empresa, de modo que o cumprimento dos mencionados deveres pode minimizar a incerteza e a imprevisibilidade inerente a todos os negócios.