Tribunais de Justiça têm decidido por computar bens localizados no exterior no cálculo de partilha processada no Brasil

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Nos últimos anos tem aumentado consideravelmente o número de brasileiros com investimentos em bens móveis no exterior, o que, geralmente, enseja a aplicação das regras internacionais na partilha do patrimônio recebido no exterior, seja no processo de inventário ou de divórcio.

No entanto, os Tribunais de Justiça de nosso País têm autorizado a possibilidade de considerar esse patrimônio no cálculo da partilha dos bens situados no Brasil, como se vê do acórdão proferido pela 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (Acórdão nº 1321525). No referido julgado foi decidido que o juízo do inventário deve considerar e computar os valores depositados no exterior na partilha realizada no Brasil. No caso, tratava-se da análise de indeferimento de processamento da partilha de valores depositados em contas bancárias no exterior.

Por se tratar de bem fungível, móvel e de fácil movimentação, entendeu o TJDFT que não há como se indeferir o processamento para fins de partilha de valores que devem ser considerados para a “justa divisão dos bens do espólio” e destacou que, se for o caso de direito a crédito, a execução será consoante as regras vigentes no país em que os valores se encontram.

Nesse mesmo sentido decidiu a Oitava Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em sede de agravo de instrumento nº 2012466-60.2021.8.26.0000 reformou decisão que havia determinado que o inventariante retificasse as primeiras declarações para excluir os bens localizados no exterior e o VGBL de titularidade da viúva meeira.

Entendeu o colegiado paulista pela reforma da decisão, tendo em vista vultoso patrimônio no exterior que, caso não fosse levado em consideração, haveria risco de comprometer a igualitária partilha dos bens: “Só a considerar os valores dos bens no estrangeiro, poder-se-á proporcionar partilha igualitária, equilibrando-se o patrimônio de forma a assegurar os direitos de ambos os cônjuges, especialmente em face da possibilidade de compensação de valores sem vilipêndio às normas”.

O Superior Tribunal de Justiça se posicionou no mesmo sentido em dois casos que aqui destacamos:

No Recurso Especial nº 1.410.958/RS, em que se discutiu se poderia ser incluído na partilha, além das cabeças de gado, direitos de contrato de arrendamento mercantil e ações relativas à sociedade empresária no Uruguai.

Ao analisar o caso, o Ministro Relator do Recurso Especial nº 1.410.958/RS, Paulo de Tarso Sanseverino, destacou que, nestes casos, cumpre ao Magistrado atentar-se ao direito material que não excepciona bens existentes fora do Brasil: “Quanto à competência da jurisdição brasileira para dispor sobre a partilha dos valores depositados no exterior, cabe frisar o conteúdo do artigo 10, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens”. E acrescentou: “Se assim o fosse, para dificultar o reconhecimento de direito ao consorte ou vilipendiar o que disposto na lei brasileira atinente ao regime de bens, bastaria que os bens de raiz e outros de relevante valor fossem adquiridos fora das fronteiras nacionais, inviabilizando-se a aplicação da norma a determinar a distribuição equânime do patrimônio adquirido na constância da união”.

Para que não ocorra nenhuma violação do direito alienígena ou invasão de território estrangeiro, deve ficar claro que o que deve ser feito é levar-se em consideração os valores de bens recebidos no exterior para fins de rateio e, assim, equilibrar os patrimônios de acordo com o valor dos aquestos existentes no Brasil e fora dele.

A Ministra Maria Isabel Gallotti, nos autos do Recurso Especial de nº 1.552.913/RJ, em um caso envolvendo um divórcio apreciou se determinado valor depositado em instituição financeira nos Estados Unidos da América poderia ser convertido em real para garantir o crédito de metade do valor à parte recorrente.

A Relatora destacou que, após a edição do Código de Processo Civil de 2015, a competência exclusiva para dirimir sobre partilha de bens no exterior no tocante apenas aos casos de inventário causa mortis (RESP 535.646/RJ) não faz mais sentido, uma vez que o art. 23, inciso II do atual diploma processual dispõe expressamente que compete à autoridade brasileira, com exclusão de qualquer outra, “em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional”.

Assim, acrescentou: “Dessa forma, ainda que o princípio da soberania impeça qualquer ingerência do Poder Judiciário Brasileiro na efetivação de direitos relativos a bens localizados no exterior, nada impede que, em processo de dissolução de casamento em curso no País, se disponha sobre direitos patrimoniais decorrentes do regime de bens da sociedade conjugal aqui estabelecida, ainda que a decisão tenha reflexos sobre bens situados no exterior para efeitos da referida partilha. Caberá à parte, assim entendendo, promover a efetivação de seu direito material aqui reconhecido mediante os trâmites adequados conforme o direito internacional.”.

Portanto, o que se verifica é que de acordo com os julgados aqui apresentados é que os Tribunais de Justiça Pátrios têm decidido pelo cômputo de bens localizados no exterior no cálculo de partilha processada no Brasil.

Informe escrito por:

Daniela Soares Domingues

Sócia Coordenadora do Setor Contencioso Estratégico e Arbitragem

ddomingues@siqueiracastro.com.br

Marina de Araujo Lopes

Sócia do Setor Contencioso Estratégico e Arbitragem

amarina@siqueiracastro.com.br

Sarah Ramos Vaz dos Santos

Advogada do Setor Contencioso Estratégico e Arbitragem

srvsantos@siqueiracastro.com.br