STF: Alterações da lei de improbidade retroagem apenas para processos não transitados em julgado, que tenham por objeto a condenação por atos culposos

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Após 4 dias de julgamento, o Supremo Tribunal Federal definiu que as alterações na Lei de Improbidade Administrativa não devem retroagir para os casos em que já existe uma condenação transitada em julgado, exceto nas ações que estão em curso (sem trânsito em julgado), em que se discuta a modalidade culposa, hipótese em que as alterações retroagem. O Supremo Tribunal Federal decidiu, ainda, que o novo prazo prescricional de oito anos e a prescrição intercorrente não retroagem, mesmo para processos ainda em curso, fixando a seguinte tese:

1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – dolo;

2) É irretroativa a revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa contida na Lei nº 14.230/2021 (que alterou a lei de improbidade administrativa), em virtude do disposto no artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada, nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;

3) A Lei nº 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos, praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior, devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente.

4) O novo regime prescricional previsto na Lei nºº14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.

Abaixo segue quadro sintético com o Voto de cada Ministro da Corte:

MINISTROVOTO
MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES
(RELATOR
Votou no sentido de dar provimento ao recurso extraordinário, para extinguir a ação, sugerindo, para fixação de repercussão geral, a seguinte tese (com quatro tópicos): 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se nos arts. 9˚, 10˚ e 11º da Lei de Improbidade Administrativa a presença do elemento subjetivo “dolo”; 2) A norma benéfica da Lei nº 14.230/21, revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, é irretroativa em virtude do art. 5˚, inciso XXXVI, da CF, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada, nem tão pouco durante o processo de execução das penas em seus incidentes; 3) Aplicam-se os princípios da não ultratividade e tempus regit actum aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude de sua revogação expressa pela Lei n˚ 14.230, devendo o juízo competente analisar eventual má fé ou dolo eventual por parte do agente; e 4) O novo regime prescricional previsto na Lei n˚ 14.230/21 é irretroativo em respeito ao ato jurídico perfeito, em observância aos princípios da segurança jurídica do acesso à justiça e da proteção da confiança, garantindo-se a plena eficácia dos atos praticados validamente antes da alteração legislativa;
MINISTRO ANDRÉ MENDONÇA  Propôs a seguinte fixação de tese: 1) As alterações promovidas pela Lei n˚ 14.230/21º em relação ao elemento subjetivo apto a configurar o ato de improbidade administrativa, inclusive na modalidade do art. 10, aplicam-se aos processos em curso e aos fatos ainda não processados; 2) Diante da proteção constitucional a coisa julgada, a aplicação da referida tese, quando cabível, ou seja, quando apenas a responsabilização por culpa, poderá ser objeto de ação rescisória; 3) As alterações da Lei nº14230 em relação aos novos prazos de prescrição intercorrente, aplicam-se de uma maneira imediata, inclusive aos processos em curso e aos fatos ainda não processados, tendo como termo inicial nesses casos a data de entrada em vigor da nova lei; 4) O novo prazo de prescrição geral tem aplicação imediata inclusive aos processos em curso e aos fatos ainda não processados, devendo ser computado, contudo, o tempo já transcorrido durante a vigência da norma anterior, restando o novo prazo limitado ao tempo restante do lustro pretérito quando mais reduzido em relação ao novo regramento.
MINISTRO NUNES MARQUES
(VOTO DIVERGENTE)
Acompanhou o relator no caso concreto para dar provimento ao recurso extraordinário para que o v. acórdão recorrido seja reformado, extinguindo-se a ação formalizada contra a recorrente por atipicidade da conduta culposa. Porém, divergiu quanto à tese de repercussão geral para consignar que: A aplicação retroativa da Lei nº 14.230/2021 não significará anistia geral das ações de improbidade administrativa. Serão atingidas apenas as ações pendentes em 26.10.2021, nas quais (a) houver a acusação da prática de improbidade culposa, sem trânsito em julgado da sentença condenatória; (b) tiver transcorrido 08 (oito) anos entre a conduta ímproba dolosa e a instauração de inquérito civil e o ajuizamento da ação; (c) tiver transcorrido o prazo de 04 (quatro) anos depois de ajuizada a ação sem publicação de nenhum pronunciamento judicial condenatório de confirmação. Estão fora do alcance da retroação (i) sentenças condenatórias transitadas em julgado antes do advento da Lei nº 14.230 de 2021; (ii) a pretensão de ressarcimento do dano ao erário em razão de conduta dolosa descrita Lei nº 8429/92; (iii) ações em tramitação em 26.10.2021 que não se enquadrem nas hipóteses “a”, “b” e “c” supramencionadas.
MINISTRO FACHIN
(VOTO DIVERGENTE II)
Votou pela irretroatividade total da nova lei de improbidade, pois entende que uma vez reconhecida a natureza civil da improbidade administrativa não há como se aplicar a irretroatividade das suas alterações de forma parcial, devendo, portanto, a irretroatividade ser total, divergindo, nesse ponto, do Ministro Alexandre de Moraes, que entende que nas ações pendentes por conduta culposa não poderia se aplicar a lei antiga, tendo em vista a atipicidade.
MINISTRO LUIS ROBERTO BARROSOAcompanhou em maior parte o voto do relator.  No entanto, em uma única questão, acompanhou a divergência inaugurada pelo Ministro Fachin, pois uma vez reconhecida a natureza civil da improbidade administrativa não há como se aplicar retroatividade das suas alterações de forma parcial, devendo, portanto, a irretroatividade deve total. Desse modo, a nova lei não deve retroagir naquelas ações de improbidade administrativa por condutas culposas sem condenações transitadas em julgado.
MINISTRO DIAS TOFFOLLI  Acompanhou o Ministro Nunes Marques em maior parte, divergindo apenas no ponto relativo de que a nova lei deve retroagir, inclusive, aqueles casos com decisões transitadas em julgado, cabendo ao juízo da execução aplicar o abolitio criminis.
MINISTRA ROSA WEBER  Acompanhou em maior parte o voto do relator.  No entanto, em uma única questão, acompanhou a divergência inaugurada pelo Ministro Fachin, pois uma vez reconhecida a natureza civil da improbidade administrativa não há como se aplicar retroatividade das suas alterações de forma parcial, devendo, portanto, a irretroatividade deve total. Desse modo, a nova lei não deve retroagir naquelas ações de improbidade administrativa por condutas culposas sem condenações transitadas em julgado.
MINISTRA CÁRMEN LÚCIAAcompanhou em maior parte o voto do relator.  No entanto, em uma única questão, acompanhou a divergência inaugurada pelo Ministro Fachin, pois uma vez reconhecida a natureza civil da improbidade administrativa não há como se aplicar retroatividade das suas alterações de forma parcial, devendo, portanto, a irretroatividade deve total. Desse modo, a nova lei não deve retroagir naquelas ações de improbidade administrativa por condutas culposas sem condenações transitadas em julgado.
MINISTR RICARDO LEWANDOWSKIVotou no sentido da (i) irretroatividade da aplicação da nova lei nos casos de improbidade por conduta culposa com condenações transitadas em julgado, ressalvada a possibilidade de ajuizamento de ação rescisória; (ii) retroatividade da aplicação da nova lei nos casos de improbidade por conduta culposa sem condenações transitadas em julgado, devendo o juízo de execução extinguir a ação por atipicidade de conduta; (iii) retroatividade da prescrição geral; e (iv) irretroatividade da prescrição intercorrente, tendo como marco inicial a data de publicação da nova lei.
MINISTRO GILMAR MENDES  Propôs a seguinte fixação de tese: 1) São atípicos os atos de improbidade administrativa praticados culposamente sem a comprovação de dolo antes de 21/10/2021 tendo em vista a retroatividade da lei 14230/21; 2) o novo prazo prescricional previsto no artigo 23 da Lei nº 8429/92 na redação conferida pela Lei nº14.230/21 retroage para alcançar ato de improbidade administrativa praticados antes da vigência da nova lei; 3) a retroatividade da Lei nº 14.230/2021 para alcançar atos de improbidade administrativa praticados antes de sua vigência opera-se independentemente do trânsito em julgado, ressalvados os efeitos já exauridos da sentença condenatória e a imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário fundada na prática de atos dolosos tipificados na lei de improbidade; e 4) a prescrição intercorrente prevista no parágrafo oitavo do artigo 23 da Lei nº 8429/92 não retroage para atingir ações de improbidade ajuizadas antes do advento da Lei nº 14.230 /21, considerada sua natureza processual, tendo como termo inicial da data de vigência da nova lei.
MINISTRO LUIZ FUXAcompanhou integralmente o voto do relator.

Escrito por:

Daniela Soares Domingues

Sócia Coordenadora do Setor Contencioso Estratégico e Arbitragem

ddomingues@siqueiracastro.com.br

Marina Araujo Lopes

Sócia do Setor Contencioso Estratégico e Arbitragem

amarina@siqueiracastro.com.br