Para 5ª Turma do STJ, atos praticados em um mesmo ciclo complexo de lavagem de dinheiro não caracterizam crimes autônomos

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A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, deu parcial provimento ao Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.875.233 entendendo que consumação do crime de lavagem de dinheiro por um ciclo complexo de atos não caracteriza crime único, não havendo continuidade delitiva.

Na origem, a Ação Penal tramitou perante a 13ª Vara Federal de Curitiba/PR e foi conduzida pelo então juiz Sérgio Moro, que condenou os réus por lavagem de dinheiro, apontando a corrupção como crime antecedente. Vale destacar, porém, que não houve denúncia ou condenação dos réus por corrupção ativa e passiva, por ausência de identificação dos servidores públicos envolvidos.

Entende-se do acórdão que, segundo a denúncia, um dos acusados, então deputado federal, teria utilizado a sua influência política para garantir a contratação de determinada empresa fornecedora de softwares e serviços de informática pela Caixa Econômica Federal, o que teria lhe rendido R$2,3 milhões. O MPF sustentou ainda que os acusados teriam, por três vezes, simulado a prestação de serviços, emitindo notas fiscais fictícias e celebrando contratos ideologicamente falsos entre a empresa contratada e empresas terceiras a fim de repassar o valor ao deputado, dissimulando a origem ilícita.

Contudo, tudo isso ocorreu mediante uma série de atos concatenados: a interposição fraudulenta das empresas terceiras, a emissão de notas fiscais fictícias e o saque de valores. Ocorre que, no TRF4, esse contexto fático ensejou a reforma da decisão de primeiro grau para condenar os acusados por três atos de lavagens diferentes, em continuidade delitiva. Desse modo, aplicou-se a pena de um ato de lavagem, com o aumento previsto no art. 71 do Código Penal.

Em sede recursal, porém, o Min. João Otávio de Noronha, redator o voto vencedor, divergiu e resgatou a sentença de piso que já havia afastado essa tese acusatória. Segundo argumentou o Ministro, a lavagem de dinheiro é caracterizada por “atos de dissimulação e ocultação de proveitos do delito com a finalidade de dificultar a rastreabilidade da origem criminosa”. Desse modo, todos atos indicados na denúncia constituem parte de um mesmo ciclo complexo de branqueamento de capitais e foram praticados para esconder o beneficiário dos valores e dar aparência lícita ao repasse.

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Assim sendo, sob a ótica de que eles estão inseridos no mesmo contexto, não admitiu o fracionamento do complexo ciclo de lavagem operacionalizado no caso para o reconhecimento de crimes autônomos em continuidade delitiva. Aliás, frisou que entendimento contrário ensejaria até mesmo a incompetência do Juízo de Curitiba/PR, haja vista que os depósitos ocorreram em São Paulo/SP, local em que estavam sediadas as empresas terceiras.

Com estes fundamentos, sagrou-se vencedor o voto divergente do Ministro João Otávio de Noronha, restando vencido o relator, Desembargador convidado Jesuíno Rissato.

REsp 1.875.233