A Lei 13.444/2017 criou o documento único de identificação nacional, o “DNI” Documento Nacional de Identidade, que chega com a intenção de a substituir o RG (registro geral ou carteira de identidade, que hoje não tem um registro nacional, mas sim um número diferente em cada estado e no DF), a carteira de trabalho, o documento de CPF, as certidões de nascimento e de casamento, o número de contribuição para o PIS/Pasep, o cadastro em programas sociais do governo e o certificado de reservista. Essa mudança permitirá que o cidadão possua um único documento de identificação nacional.
O que muda na vida dos cidadãos, e quais os reflexos positivos e negativos na segurança, tanto pessoal quanto corporativa?
À medida que nos adaptamos às novas necessidades de segurança, tanto pessoais quanto corporativas, temos visto um crescimento no uso de ferramentas de autenticação. Mas será que já atingimos maturidade para aceitação desses processos virtuais de autenticação?
Nos dias de hoje, em razão da descentralização das identificações, ainda é preciso adotar outras medidas para confirmar a identidade de determinado cidadão. Já fizemos grandes avanços nos últimos anos, e com o impulso criado pelo momento pandêmico que vivemos nos últimos anos, foi necessário acelerar a adoção de medidas de segurança, bem como a racionalização da documentação digital. O mundo virtual se tornou uma realidade bem mais rápido do que esperávamos.
O maior exemplo disso é a criação do novo RG digital, que será o documento oficial dos brasileiros, onde, o número do documento não será mais o número do Registro de Identidade, mas sim do Cadastro de Pessoa Física (CPF) do cidadão. Essa mudança visa acabar com o sistema atual, onde cada estado tem sua própria numeração de RG. O novo modelo do documento único de identidade foi apresentado pelo Governo em meados de fevereiro desse ano.
No formato atual de identificação civil, o cidadão pode solicitar uma via de RG em diversos estados da Federação, com numerações diferentes. E fazendo isso em cada um dos estados brasileiros, ele poderá ter 27 números de RG distintos. O que certamente é um prato cheio para os maus intencionados.
Com o novo documento “DNI”, que começará a ser emitido em 2023, porém, somente será obrigatório no ano de 2032, essa distorção tende a desaparecer, e, cada cidadão terá uma identificação nacional e um único número de identificação individual: o do CPF.
Algumas mudanças que ela proporciona:
- A autenticidade do documento poderá ser checada por QR code, inclusive ‘offline’, já que apenas o número do CPF será utilizado;
- A população também terá acesso à carteira de identidade digital pelo site do Governo Federal – Gov.br;
- Quando for emitida uma carteira de identidade em uma unidade da federação diferente daquela onde foi feita a primeira, ela passará a ser considerada segunda via;
- O cidadão poderá, no momento da emissão, optar por incluir no documento informações de saúde, como o grupo sanguíneo, se é doador de órgãos ou outros dados que possam contribuir para salvar a sua vida.
Qual a principal contribuição da identidade digital para a sociedade brasileira em geral?
A resposta objetiva é: criar um mecanismo de identificação mais seguro e evitar fraudes, sejam físicas ou virtuais.
Hoje, tem sido um problema crescente para as empresas, combater as tentativas de vazamento e furtos de dados pessoais de clientes, de fundos corporativos etc. Esses “bancos de dados” pessoais são moeda de negócio e muito disputados nos “porões” de universo de fraudes.
Um estudo realizado pela Juniper Research – Grupo especializado em segurança cibernética no início de 2022 indica que, até 2023, fraudes em transações e pagamentos online deverão gerar prejuízos anuais que ultrapassarão a marca de US$ 48 bilhões (dados globais).
No Brasil, a Serasa Experian, divulgou em maio de 2022, que no mês de março, foram registradas 389.788 tentativas de fraude, o que representa um aumento de 18,9% em relação ao mesmo período em 2021, o que significa que a cada 7 segundos um brasileiro é vítima dos fraudadores. O segmento que mais sofre com esse quadro é o varejo, com uma alta de 74,1% nas tentativas de fraudes.
Em outro estudo percebemos que mais de 17% de todas as transações globais de comércio eletrônico durante a temporada de compras de fim de ano de 2021 foram fraudulentas, um aumento de 25% em relação ao resto do ano.
As empresas estão desenvolvendo ferramentas e sempre buscando proteção para si mesmos e seus clientes contra fraudes, e muitas empresas, particularmente as de comércio eletrônico, têm adotado protocolos de identidade digital.
O objetivo é não apenas para evitar o furto de dados e informações, mas também assegurar a fidelidade do cliente, bem como evitar um possível desistência dos clientes devido à fragilidade percebida na segurança cibernética.
A preocupação tem fundamento, pois, os consumidores têm “pouca” ou “nenhuma” probabilidade de continuar usufruindo dos serviços depois de terem seus dados inseridos numa situação de fraude.
A própria pagina do Senado Federal informa que a unificação dos documentos de identificação tem por objetivo primário o combate as fraudes, vejamos: “As falsificações de documentos geram prejuízos anuais de cerca de R$ 60 bilhões ao país, o que é facilitado pelo fato de haver cerca de 20 documentos de identificação utilizados pelos brasileiros. No mês passado, foi sancionada a Lei 13.444/2017, que institui a Identificação Civil Nacional (ICN), cadastro único criado com o objetivo de dificultar fraudes”.
Essa norma que estabelece a criação de um número único de documento de identificação, compartilhando bases de dados da União com estados e Distrito Federal, tem como meta também, amenizar os prejuízos causados por fraudes por dupla ou tripla identificação ou falsidade.
O novo documento de identificação civil irá unificar a partir de um só número, que englobará os demais, referentes aos outros documentos. E esse número certamente será o mais confiável para a identificação do cidadão. O Brasil é um país de dimensões continentais, e possui bancos de dados com registros de identidade separados por estado. A concentração dos documentos, portanto, irá coibir falsificações.
O DNI terá biometria, fotografia e está em estudo a possibilidade de também ter um chip, como os de cartões de crédito, para dificultar a
falsificação. O CPF será o principal número, não havendo uma nova numeração do RG, sendo uma forte medida de segurança. O objetivo é permitir que os números sejam compartilhados pelo máximo de entidades governamentais, para dar mais confiabilidade aos nossos documentos.
É fato hoje, que sem os dados biométricos, a carteira de identidade, que é extraída nos estados da Federação, muitas vezes acaba servindo como celeiro para à falsidade e o cometimento de atos ilícitos.
Prevenção e investigação de falsificações
O policial legislativo do Senado Gustavo Rodrigues acredita que a unificação do cadastro de identificação pode ser útil para prevenção e apuração de crimes, desde que as unidades criminais sejam integradas e o sistema, otimizado.
— Vai ser melhor quando for possível associar esse cadastro único ao banco de dados de antecedentes criminais, por exemplo, que hoje é diferente em cada estado. Quando uma pessoa cometer uma infração ou crime em um local, já vai ser mais fácil verificar se ela é procurada ou tem antecedentes em outra parte do país. Hoje existe o Sistema Nacional de Segurança Pública, o Sinesp Infoseg, da Secretaria Nacional de Segurança Pública [Senasp], que pode ser aperfeiçoado — argumenta.
Segundo a mesma fonte, que já foi policial civil, a falsificação de documentos em si já é crime, mas costuma ser “um caminho para outros crimes, como estelionato ou falsidade ideológica”.
Afirma ainda, que alguns infratores usam um documento falso de pessoa física para criar uma pessoa jurídica (CNPJ) também falsa. Essa falsa pessoa jurídica contrata empréstimos, financiamentos, faz compras a prazo e, depois, os bancos, instituições financeiras e empresas não têm como cobrar de alguém que não existe.
— Já houve um caso de um cidadão que entrou no Congresso Nacional com um documento falso e foi à agência da Caixa para abrir uma conta. Só que a Polícia Legislativa e o gerente do banco conseguiram identificar a fraude e ele foi condenado a três anos e seis meses de reclusão.
Também afirma que, para a segurança institucional, o cadastro único será vantajoso.
— Uma pessoa que entra num edifício público fica registrada com o número de RG da unidade da Federação que apresentar. Se ela pratica algum dano ao patrimônio público, como furto ou depredação, uma lesão corporal ou uma agressão verbal, ela fica sob controle de acesso, ou seja, se tentar entrar novamente com o documento, será barrada. Hoje essa mesma pessoa pode tentar voltar com uma identidade outro estado ou um outro documento com número diferente. Aqui nunca houve um caso assim, mas com um cadastro único deixará de haver até o risco — explica.
Regulamentação junto ao TSE
O secretário-geral da Presidência do TSE, Luciano Fuck, afirmou que o TSE já iniciou os estudos para verificar a compatibilização do cadastro eleitoral e sua expansão para a identificação nacional.
— Claro, isso vai exigir uma regulamentação, e a previsão é que ela saia ainda neste semestre. Também há a necessidade de um decreto do presidente da República e de uma resolução do TSE baseada em critérios técnicos para uso do banco de dados. A resolução é que vai determinar, por exemplo, se o registro biométrico será de todos os dez dedos das mãos ou não — explica.
Embora o presidente da República tenha vetado o dispositivo do projeto que garante a gratuidade da nova identificação, a lei não exige a troca do documento que ainda estiver válido.
Segundo o secretário-geral da Presidência do TSE, os cidadãos que não têm condição de pagar serão isentados, como o são em outros procedimentos, como nas ações judiciais, por exemplo.
— Mas é importante a cobrança pela emissão do documento até mesmo para viabilizar o lançamento o mais rápido possível desse importante instrumento de garantia da identificação das pessoas.
O TSE está fazendo várias estimativas sobre o custo do documento, mas vai depender da quantidade de informações que ele vai agregar. Tudo isso será levado em consideração.
O documento, disse o secretário, vai aproveitar todos os dados constantes do cadastro eleitoral. Então, se o cidadão já fez o cadastramento biométrico, ele não vai necessitar fazê-lo novamente. Quem ainda não tem, vai ter que inserir os dados.
Também foi vetado o artigo que dava à Casa da Moeda a exclusividade para implantação e fornecimento do documento.
— Ela, no entanto, participará do fornecimento. Apenas não será feito de forma exclusiva — disse o deputado.
No curso do mês de junho, o Congresso manteve os vetos.
Para Fuck, à medida que o documento for se tornando importante para que o cidadão consiga se identificar, abrir contas em bancos, receber aposentadoria, enfim, exercer seus direitos e cidadania, a tendência é que cresça o número de adesões ao novo instrumento de identificação.
Conclusão
Atualmente, o modelo de identificação civil no nosso país, favorece os fraudadores, uma vez que pode se constituir números de RG em diversos estados da Federação.
Com o DIN contendo um número único, terá um ponto inibidor, pois os órgãos de inteligência do Governo Federal, bem como as delegacias de Polícia Civil estaduais, Policia Federal, Receita Federal, tribunais de contas dos estados, os Tribunais Eleitorais terão maior controle para combater as fraudes e identificar os possíveis responsáveis.
Sabemos que à medida em que os fraudadores tenham limitações para agir, buscarão criar novos golpes a partir de seu conhecimento, porém, nesses casos, seria muito mais rápido a identificação dos grupos que surgissem, com uma abordagem abrangente de prevenção a fraudes, tendo em vista que as informações seriam unificadas.
Mas a contratação de serviços de prevenção à fraude e uma estratégia para avaliar e mitigar o risco de cibersegurança, pois, serão essenciais para a prevenção de fraudes a curto e médio prazos.
Escrito por Oswaldo da Silva Abritta, advogado da SiqueiraCastro