No dia 04/02, em sede de Recurso Especial interposto perante o Superior Tribunal de Justiça, o Ministério Público Federal se manifestou contrariamente ao entendimento do TJSP sobre aplicação da Lei Maria da Penha para mulheres trans. Segundo o Tribunal, a lei só se aplicaria a casos de violência contra “pessoas do sexo feminino”.
No entanto, não é isso que diz a lei. Ela, na verdade, objetiva a proteção de mulheres vítimas de violência de gênero, em especial em situação de violência doméstica, não fazendo qualquer restrição de caráter biológico (até porque isso, segundo nosso entendimento, seria inconstitucional).
Nesse cenário, revela-se importante esclarecer que “gênero”, nos termos da lei, é um conceito mais amplo do que o “sexo feminino”, expressão utilizada pelo Tribunal de São Paulo para afastar a incidência da lei protetiva ao universo trans. A identidade de gênero se refere à experiência interna e individual, como cada pessoa se percebe na sociedade, que pode corresponder ou não ao sexo atribuído no momento do nascimento.
Embora o entendimento do MPF seja absolutamente correto, não deixa de despertar a dúvida: por que uma manifestação dessas foi necessária em 2022? Como a transexualidade ainda é reduzida a características biológicas, levando à desumanização das pessoas trans? Há tanto a avançar dentro das pautas das minorias, mas ainda estamos presos no básico.
Mulheres trans são mulheres e não deveriam ter que lutar e chegar às últimas instâncias, literal e metaforicamente, para conseguirem ser reconhecidas como tal.
Texto escrito pela advogada Beatriz Trevisan.