Na próxima sexta-feira, dia 31, o fim do recesso forense do Supremo Tribunal Federal (STF) lançará luzes sobre dois pontos que tocam a atuação do Tribunal de Contas da União (TCU): a prescritibilidade do ressarcimento de danos ao erário e a decretação de medidas cautelares (bloqueio de bens e desconsideração da pessoa jurídica) no âmbito do TCU.
A discussão da prescritibilidade pode apontar para uma quebra de paradigma – ou seja, da tese da imprescritibilidade de ressarcimento ao erário – até então adotado no TCU ou gerar novas interpretações moderadas no tocante à contagem do prazo para a recomposição do débito.
Cabe lembrar que o caso concreto envolve ação de execução fiscal, ajuizada pela União Federal e fundada em acórdão do TCU, que condenou gestora pública a ressarcir dano ao Poder Público. No bojo do Recurso Extraordinário (RE) nº 636.886, o STF considerou que, no caso de dívida ativa não tributária, o débito apurado em processo de tomada de contas deve ser executado, considerando o prazo prescricional quinquenal, na forma da Lei de Execução Fiscal e do Código Tributário Nacional, reconhecendo, ainda, a matéria como “repercussão geral” (fixando o Tema 899).
É verdade que posição conservadora sustenta a aplicação de prazo prescricional quinquenal, em matéria de ressarcimento ao erário, apenas às ações judiciais de execução intentadas pela Fazenda Pública e não durante o processamento e a constituição do débito em discussão no âmbito do TCU. Contudo, é importante destacar que os argumentos expostos ao longo da decisão do STF – segurança jurídica, imprescritibilidade deve ser taxativa e excepcional – também exercem influência sobre a conformação do ordenamento jurídico.
Não é à toa que o próprio TCU tem adotado postura cautelosa no trato do assunto, conforme se infere da instrução técnica exarada nos autos do TC 027.624/2018-8, inclusive opinando pelo sobrestamento do referido feito até que haja o trânsito em julgado da matéria no STF. Nesta instrução, assume relevo a discussão sobre a abrangência da decisão do Supremo (se somente na fase constitutiva, condenatória e/ou apenas na fase de execução) e, principalmente, a respeito da edição de norma específica sobre o prazo prescricional no âmbito do controle externo e da utilização da Lei nº 9.873/99 cujo prazo é quinquenal.
No STF, a expectativa refere-se à oposição de embargos de declaração de interessados em conferir modulação aos efeitos, objetivos e subjetivos, da referida decisão proferida no RE nº 636.886.
Outro aspecto que direciona um olhar atencioso à retomada dos trabalhos do STF refere-se à utilização da medida cautelar de indisponibilidade de bens e do instituto da desconsideração da pessoa jurídica pelo TCU.
Em 25 de junho, dias antes do recesso do STF, o Ministro Marco Aurélio Mello proferiu voto no bojo do MS 35.506/DF, reiterando seu posicionamento, em sede liminar, no sentido de que não caberia ao TCU, órgão administrativo e auxiliar do Congresso Nacional, o implemento de medida cautelar a restringir direitos de particulares, de efeitos práticos tão gravosos como a indisponibilidade de bens e a desconsideração da personalidade jurídica em sanções patrimoniais antecipadas.
Os artigos 70 e 71 da Constituição Federal, que tratam das competências do TCU, não autorizariam raciocínio diferente. O artigo 44 da Lei nº 8.443/1992 (LOTCU), por sua vez, refere-se ao responsável pela contratação ou ato público, ou seja, ao servidor ou gestor público, não podendo ser cogitado para a imposição de cautelar de decretação de bloqueio de bens em face de particulares contratados. A desconsideração da pessoa jurídica também seria absolutamente inviável, sendo inconcebível alegar a aplicação, por analogia, do artigo 14 da Lei nº 12.846/2013 (inaplicável aos órgãos de contas) em desrespeito à legalidade administrativa estrita.
Isso não significa dizer que o TCU não possa requerer ao Poder Judiciário, por meio do Ministério Público e na forma do art. 61 da LOTCU, a decretação de tais medidas no exercício de seu poder geral de cautela, desde que observados os limites temporais, circunstanciais e a proporcionalidade das medidas cautelares cogitadas.
Por todo o exposto, torna-se legítima a expectativa de que a retomada dos trabalhos do STF ressoe internamente sobre as práticas adotadas pelo TCU referentes à prescritibilidade da pretensão de ressarcimento de danos ao erário e à aplicação de medidas cautelares de indisponibilidade de bens e de desconsideração de pessoas jurídicas.
O Setor de Direito Administrativo, Regulatório e Infraestrutura da SiqueiraCastro está à disposição para prestar informações adicionais sobre o tema e seguirá acompanhando seus desdobramentos para manter você informado.